Thursday 17 October 2013

Elemental - A elementar volta do ícone pop

               

   O Tears for Fears foi outra das bandas que marcaram minha vida, principalmente porque essa ouvi de todos os lados: meus tios gostam, meu pai gosta, minha mãe gosta. Eu demorei para aprender a apreciar de fato o conjunto musical deles porque só depois de ouvir a discografia e digeri-la é que entendi a dimensão da musicalidade que abrange. Não é à toa que eles venderam 25 milhões de cópias, ao todo, dos pouquíssimos seis álbuns e uma coletânea que eles possuem. Tive a oportunidade de desfrutar de um show deles em São Paulo, em 2011, no Credicard Hall, e o que eu vi é uma banda totalmente em forma, com uma performance perfeita e emocionante, e o que eu espero sinceramente é que haja um novo disco de presente para nós, em breve.
                Mas eu vou falar hoje de um disco não muito famoso da carreira deles, o “Elemental”. Eu poderia falar do “Raoul and the Kingsof Spain” que é menos famoso ainda (e tão bom quanto, na minha opinião), mas o fato é que “Elemental” é o marco para a volta da banda. Em 1991, Curt Smith e Roland Orzabal, que praticamente são o Tears for Fears, pois escreviam e compunham mais de 90% do material da banda, romperam a parceria por vários motivos: Smith queria reduzir a carga de trabalho (havia rompido o casamento durante a turnê do The Seeds of Love), Orzabal insistia em produzir, mesmo tendo sido criticado e falhado em tentativas anteriores (e ele estava, de certa forma, impondo essa produção) e o empresário Paul King havia falido a sua empresa que administrava a banda desde 1982, a King’s Outlaw Management Agency, que ao longo dos anos 80 havia gerado dívidas em cima de dívidas devido a fraudulências cometidas por King, que inclusive foram descobertas por Orzabal. Após esse rompimento, o Tears for Fears continua com Roland Orzabal, gravando o single Laid So Low (Tears Roll Down), que alcançou uma boa posição nas paradas e foi incluso na coletâneaTears Roll Down (Greatest Hist 1982-1992), que também teve um tremendo sucesso comercial, sendo condecorado com disco duplo de platina no Reino Unido. Mas é em 1993 que um álbum de inéditas é lançado novamente sob o nome Tears for Fears.
                Mas se a banda é apenas Roland Orzabal e Curt Smith, “Elemental” não seria apenas um álbum solo de Orzabal? Não. Mesmo sem Smith, esse álbum carrega a essência do Tears for Fears, a riqueza musical, a abundancia de timbres, de ritmos, letras que questionam e aconselham o ser humano moderno, enfim: o máximo da qualidade pop que a banda sempre teve. Além disso, podemos ouvir em “Tomcats Screaming Outside”, álbum solo de Orzabal, uma proposta bem diferente, em todos os quesitos, do Tears for Fears. O que não se pode negar é que esse álbum carrega toda a emoção e estrutura de Roland. “Elemental” foi gravado em um estúdio construído na casa dele, o “Neptune’s Kitchen”, na intenção de Roland ficar mais perto de sua esposa, que na ocasião estava gravida, e de gastar menos, é claro. Esse foi o trabalho, de fato, que ele se consolidou como produtor, e que envolveu basicamente o trabalho de quatro pessoas: ele, Allan Griffiths (guitarrista e colaborador de longa data do Tears for Fears, um dos poucos também em que colaboravam para escrever material), Tim Palmer (produtos que havia trabalhado com Roland no último single e futuramente com outros artistas, como o Pearl Jam em seu álbum TEN) e Bob Ludwig, que fez a masterização. Com exceção de alguns músicos, como Guy Pratt (baixista em algumas faixas, que viria a gravar o último álbum do PinkFloyd, The Division Bell), o álbum inteiro foi feito por esse pequeno grupo. Orzabal disse em algumas entrevistas que ele tinha uma obsessão muito grande em cada música que gravava, não descansando até que alcançasse a sonoridade desejada. Ele também relata que estava mais maduro e, de uma certa forma, diferente daquele Roland que havia acabado de sair da escola do primeiro álbum da banda.
                Na primeira música, “Elemental” já sentimos a riqueza da produção e dos timbres, com uma atmosfera de diversas camadas, que incluem além de guitarra, baixo e bateria, teclados e sintetizadores, inclusive com efeitos sonoros (o som de um elefante pode ser ouvido). Isso reflete também a experiência que Roland estava tendo podendo trabalhar em casa, explorando melhor o equipamento que possuía. A letra, mesmo com a mesma alma das antigas músicas, reflete um pensamento mais maduro, mais navalha, como na frase do refrão “Don’t say you’re up when you’re down/ It’s elemental”, que mostra mais dessa ideia que Roland queria trazer de que o mundo não é só maravilhas e feito apenas de conquistas e sucesso. Esse conceito é melhor ilustrado no grande hit do álbum, “Break it Down Again”, onde Orzabal descreve a beleza de cair e se levantar de novo e o quão isso é natural na vida. Outra coisa que é notada é a forte presença de guitarras, uma diferença considerável se analisarmos a quantidade de camadas que existe em relação aos álbuns anteriores, o que trouxe uma roupagem nova nesta música, coisa que o Tears for Fears sempre fez de álbum para álbum. O disco segue com “Cold”, com mais uma letra de desilusão, falando da dureza do eu-lírico em relação a corresponder ao amor, com belas camadas de vocais, um riff de baixo marcando o tempo, unindo-se a percussiva bateria e formando um interessante groove que mescla o comum ao exótico e mais sintetizadores e efeitos. “Break it Down Again”, como dito anteriormente, foi o hit do álbum, sendo lançado antes como single e atingindo um certo sucesso comercial, parte pela letra, parte pelo ritmo dançante, e aqui percebemos o gosto de Roland por usar timbres de corda, muitos dos quais ele mesmo tocou nos seus teclados.
                “Mr. Pessimist” traz quase que uma atmosfera eletrônica, carregada de teclados, com uma guitarra desfilando em frases cheia de efeitos, abrindo parte da música para um instrumental belo, destacando o solo de piano que encerra a faixa. “Dog’s a Best Friend’s Dog” traz uma pegada mais rock, com um riff de guitarra marcante, um órgão Hammond rasgando e um refrão fácil. Mais uma vez, a letra carrega a mensagem de “pé no chão”, em partes que em coro repetem “Some dreams you dream alone”, por exemplo. A mesma sentença serve para “Fish Out of Water” (quase que a mesma ideia em “You’re dreaming your life away”), que traz uma belíssima balada com uma bela cozinha de violão, bateria e baixo em um refrão marcante, assim como mais sintetizadores e pianos que criam o embalo da música. “Gas Giants” é um interlúdio eletrônico quase que instrumental para as três faixas finais do discos, que quase são uma sequência. “Power” é uma linda canção, com a letra falando alegoricamente sobre nossa sede de poder para garantir um futuro que está acontecendo no presente. Uma outra balada com refrão marcante, quase no mesmo estilo de “Fish Out of the Water”. Então vem “Brian Wilson Said”, uma homenagem que Roland fez para a grande mente por trás do Beach Boys, Brian Wilson, já que Orzabal diz que admira muito aqueles que inovam a música, principalmente se falando da música pop. Esta faixa lembra em alguns momentos Beatles (outra grande influência de Orzabal) e Beach Boys, e também tem seus momentos de jazz, como o belo solo de guitarra, acompanhada pelo piano. O disco então fecha com “Good Night Song”, uma linda balada coberta de guitarras e com uma bela cozinha “orquestral” do teclado, com uma letra que traz o incentivo de libertação, presente em tantas outras canções da banda, como a famosa Shout.
                Assim se encerra “Elemental”. Não foi um disco de grande sucesso como os anteriores, vendendo um pouco mais de meio milhão de copias e alcançando um bom lugar nas paradas dos países europeus, mas sem sombra de dúvidas ainda demonstra o poder do Tears for Fears de criar a boa música pop. Cada música parece ser um mundo diferente, devido a grande diversidade sonora, que inclui diferentes arranjos, ritmos e timbres e, ao mesmo tempo, seguindo uma linha, a linha dessa grande mente criativa que é Roland Orzabal. Mesmo sem seu grande parceiro, ele se mostrou capaz de lançar um disco a altura dos anteriores, superando-se ainda na questão da produção, que é realmente impressionante, ao pensar que esse disco foi gravado de forma independente.
                Se você está afim de ouvir algo de fácil audição e que faça você dançar, relaxar e ao mesmo tempo pensar, esse é um excelente disco. Recomendo todos os discos, e acredito que você já deve ter ouvido alguma música deles mas, tratando-se de Tears for Fears, cada disco é uma nova experiência. Segue a tracklist e o link para ouvir o álbum no YouTube:

7 – Gas Giants



Um grande abraço a todos e prometo que não demoro mais tanto para outra postagem! Boa audição!

2 comments:

  1. Superou minhas expectativas, boa pesquisa e sim ouvia mt meu filho deve ter o mesmo ouvido...e tem...bacana seu texto...obrigada, Ruth.

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    1. Obrigado, Ruth, que bom que gostou do álbum! Continue aparecendo por aqui!

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